segunda-feira, 12 de setembro de 2011

37 (3)- CONTRA GERIÃO

CONTRA GERIÃO


          Contaram depois os bardos que o herói, cheio de impaciente júbilo, desceu pela costa mediterránea, pediu-lhe prestado seu navío ao deus Helios para cruzar escondidos desde Mainake até a ilha Erytia, que estava junto à de Gádir (o que quer dizer que conseguiu umas naves de seus patrícios do empório jónio, que tinham um sol como emblema em suas velas) e conseguiu descobrir os pastos da famosa grande manada de vermelhos bois e vacas atlantes, guardada pelo terrível cão de duas cabeças Ortro, nascido do monstro Tifão e de Equidna, que tinha sido antes propriedade do imperador Atlas, e pelo chefe dos pastores de Gerión, Euritião, filho do deus da guerra, Ares (ou seja, um chefe de mercenários). Hércules lutou contra ambos no monte Abante, derrotou-osw com sua terrível maza recoberta de bronze e fez que seus homens conduzissem, de novo nas naves de Helios, à preciosa manada capturada para Mainake, que ainda hoje se chama a Costa do Sol, e depois para os territórios de sua amada, enquanto ele buscava a Gerião na capital de Atlantesos.

Mas outro pastor, Menetes, que andava pela região apacentando as vacas de Hades, avisou rapidamente a Gerião do roubo, e este saiu atrás dos ladrões com sua cabalharía de elite, enquanto Hércules ainda andava procurando a maneira de introducir-se em seu palácio de Erytia. A passo forçado, chegou o atlante ao grande rio Íber que está ao pé das montanhas do Norte e rodeou aos cuatreiros quando dispunham-se a cruzá-lo, matando à metade deles e recuperando seu ganhado. Os sobreviventes tentaram salvar-se ocultando-se nas altas montanhas onde encontrava-se sua princesa, mas Gerião, antes de pôr a suas tropas em perigo em um terreno tão difícil, preferiu mandar prender fogo à cordilleira pelos seus quatro costados.

Hércules compreendeu demassiado tarde que Gerião não estava em Erytia, e saiu correndo tras os rastos do gado, com o coração estrangulado de maus augúrios. Já desde a planície pôde divisar a imensa fumaçeira, toda a parte oriental da cordilleira parecia estar ardendo. De noite, sua luz iluminava a carreira desesperada do guerreiro penas acima, entre as brasas dos troncos calcinados.

Ao amanhecer, conseguiu chegar até o refúgio de Pyrene, mas já não havia nada que fazer, salvo gritar e chorar desconsoladamente e enterrar sua amada  na terra queimada, enterrando com ela ao último príncipe da Hespéria que ela levava em seu ventre, aos seus fiéis seguidores e a seus sonhos ibéricos.


Hércules propôs-se levantar em honra a aquele grande amor um mausoleo sem igual, e assim, com as forças de sua raiva, de sua dor e da sua vergonha por ter tomado uma decisão tão desgraçada, acumulou grandes penhascos sobre o monte até criar uma imponente pirámide de rochas, que hoje parece a cimeira maior da cordilleira, ainda que realmente há outras de mais altura.


-Agora chamamos-lhe o Pico Canigó -disse o vate ibérico que tinha contado a lenda-, ele é para nós um lugar sagrado e no solsticio de verão acendemos uma fogueira no seu cume, a velamos toda a noite e, à alva, baixamos com tochas dela para prender os fogos coletivos de toda a região, a fim de lembrar aos protagonistas desta história... Em honra a Pyrene, também chamamos Montes Pireneus à toda a longa serra.


Assim ele terminou sua narração, sendo muito aplaudido pelos assistentes. Porém, Orfeu queria saber mais e perguntou-lhe que tinha sucedido depois com Hércules e com Gerión.

-Gerión -seguiu o bardo após refrescarse um pouco-, depois de recuperar seu gado e de prender-lhe fogo aos montes, não quis, por precaução, regressar em seguida a Atlantesos, e retirou-se, em uma marcha de muitos dias, para o extremo ocidental da Ibéria, para a Terra dos Gal, onde havia imelhoraveis pastos, algo mais ao norte da serra na que tinha desembarcado o tataravó de Pyrene quando conseguiu sobreviver ao afundimento da Atlántida.
Hércules  filtró-se  entre os bloquéios do inimigo e foi pedir ajuda aos Bascões, mas a princesa Andía considerou-o culpável da ruína de sua irmã Pyrene no Leste e não quis nem lhe receber, de maneira que teve que se marchar sem homens. Subiu também às montanhas dos resistentes astures sem conseguir que sequer lhe escutassem. Mesmo assim não desanimou. Só, foi rastreando durante semanas as impressões do ganhado até a terra dos Gal e acabou o localizando enquanto os bois vermelhos pastaban em um verde vale cerca do mar.

Então dispersou a seus guardiães com uma chuva de setas e esperou escondido. Quando avisaram a Gerión de que lhe estavam roubando de novo, ele se apresentou com seus melhores guardas montados no lugar. Hercules saiu de um salto do bosque, plantou-se-lhe diante e gritou seu nome com fúria. Gerión tensó seu arco para ele, mas uma única seta certera do grego, direta ao centro de seu peito, o fez cair do cavalo lançando um bramido de dor. Aquilo satisfez suas ânsias de vingança, ainda que não pôde levar a paz a seu próprio coração, vazio e atormentado como um deserto de lava seca.
O forzudo asaetó também, ou pôs em fuga, aos desmoralizados homens de Gerión e depois recolheu e enterrou ao atlante no alto de um monte que olhava ao tempestuoso Oceano do que tinha chegado sua raça. Como oferenda póstuma à infortunada Pyrene e a seu filho não nascido, levantou sobre a tumba uma torre de pedras e acendeu sobre o alto uma fogueira, na que queimou as armas e a ensina de seu inimigo. A torre serve hoje de faro aos navegantes naquelas águas tão perigosas e todo mundo o lume a Torre de Hércules.
Os bascos descendentes de Andía, junto com os astures, resistiram e acabaram expulsando de seu montanhoso território aos descendentes de Gerión, da mesma maneira que, mais tarde, resistiriam durante séculos e séculos a qualquer que tratasse dos dominar e de lhes fazer perder suas orgulhosas identidades à força, ainda que nunca deixaram de contribuir suas potências e sua tenacidad às empresas de quem souberam lhes tratar como verdadeiros iguais e amigos. Os vascães são os mais antigos habitantes de Iberia e ainda falam uma língua própria, que é um ramo direto do antigo idioma dos Atlantes Acadianos.
A filha de Gerión, Erytia, teve um filho com Hermes, Nórax, mas seus súbditos ibéricos, azuzados pelos colonos gregos, estavam tão hartos da prepotencia tiránica dos Oceánidas, que lhe fizeram fugir a Menorca e de ali a Cerdeña, sendo sustituído pela atual dinastía de Reis da Prata” que mudaram o nome do reino de Atlantesos a Tartessos. Em Menorca e Cerdeña Nórax fez construir grandes monumentos em pedra, ao modo atlante, e por fim morreu e com ele sua linhagem, na cidade que fundou na segunda ilha: Nora.
Hercules voltou a cruzar toda Iberia e meia Europa, tendo que sofrer grandes trabalhos para lhe levar parte do ganhado a Euristeo, quem, em lugar de aproveitar as excelentes vacas atlantes para melhorar a cabaña grega, despechado pelo novo triunfo do invejado servo, preferiu lhas sacrificar à deusa Hera, zelosa e eterna inimiga do coloso.


-Assim terminou o décimo trabalho do famoso herói –disse o vate pirenaico, jogando mão a uma caneca de vinho-. Euristeo ainda lhe encomendou um undécimo, pouco depois, no que teve que voltar a Iberia para se enfrentar ao outro rei atlante da África, compinche de Gerión.

Orfeo não quis abusar do bardo Jacín, que já tinha realizado cumplidamente seu trabalho, e lhe deixou que se relajara e se integrasse no desfrute general da festa, mas ao dia seguinte o foi visitar a seu cabaña, lhe levando como oferenda de amizade uma artística fíbula para camada, em forma de cabeça de cavalo talhada na concha de um molusco, que lhe tinham presenteado a ele os recentes colonos de Rosas. Jacín agradeceu muito o detalhe, o convidó a almoçar com ele e depois lhe contou a segunda aventura de Hércules em Iberia.

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