terça-feira, 13 de setembro de 2011

61(6 )- COMPAIXÃO MAGISTRAL

COMPAIXÃO MAGISTRAL

Uma tarde que se encontravam tocando juntos ante a gruta do vate, ao mudito recolhido por Orfeo se lhe ocorreu se unir a eles com sua flauta. Isto supôs uma verdadeira ousadia por sua vez, já que era muito tímido e, pelo geral, quando tinha visitantes diante, costumava se manter discretamente apartado, ainda que colaborando todo quanto podia, como faz um bom criado.
Não acompanhou mau ao grupo durante um par de canções bem conhecidas, mas depois Metis propôs um hino que tinha certa complicação, e o pobre rapaz cometeu uma falha de tom tão audible, que as três ménades se jogaram a rir e ele ficou tão colorado e confundido que, por um momento, pareceu querer se marchar.


Surpreendentemente, Orfeo levantou-se de seu lugar habitual, sentou-se aos pés do infeliz e recomeçou a peça no mesmo tom em que o efebo a tinha abordado, convidándole com os olhos a que lhe seguisse. Ele o fez e a maestría do vate conseguiu, não só que aquela variação não desmereciera a dignidade do hino, senão que a realzara.
Também com a mirada, convidó a Aglaonice, Metis e Hebe a que se unissem no mesmo tom, o afirmou no coletivo, e depois dirigiu ao grupo tudo para tons mais altos, até que se recuperou a forma originaria da canção. Quando já todos fluíam nela, baixou o tom com um sorriso, grau a grau, e os devolveu à variação alterna incorporada pela falha do mudito, acabando com um dinâmico redemoinho musical que ia e vinha da variação ao original, acima e abaixo, em escalas bem contrapunteadas, as quais se fundiram em um final espléndido.


Todos estalaron em uma livre gargalhada de satisfação depois. Aglaonice estava admirada do virtuosismo audaz e do amor com o que aquele bardo de bardos tinha convertido um erro em uma lição de arte, devolvendo, ao mesmo tempo, seu autoestima e dignidade a seu jovem parceiro.
            

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