terça-feira, 13 de setembro de 2011

62 (2)- MORTE E RESURREIÇÂO DE DIONÍSIO

MORTE E RESURREIÇÂO DE DIONÍSIO

Era um cántico muito tradicional e sagrado, que descrevia a fúria da zelosa esposa de Zeus, Hera, depois de se inteirar de que se estava gestando o menino Dionisio no ventre de Semele, um novo fruto da infidelidad de seu marido.
Então urdió uma argucia siniestra para eliminar a seu rival: por médio de terceiros, incitou a Semele a que reprochase a seu amante, a vez seguinte que estiveram juntos, que ele só se mostrava ante ela baixo disfarces, enquanto reservava sua autêntica forma divina tão só para quando se encontrava em intimidem com a legítima rainha do Olimpo.
“Não me peças que me mostre como realmente sou, bela minha –lhe respondeu Zeus com aprensión-. Para resistir a visão da complejidad unimúltiple de um deus, há que ser uma deusa.”

Esta resposta tão prudente e sincera só conseguiu que Semele se ofendesse ainda mais. E tão agria e tão pesada pôs-se, que aburrió ao Senhor dos Ventiun Raios, quem se transfiguró de súbito na potentísima energia regidora dos Sete Mundos Interpenetrados baixo um aspecto tão multifacético, potente e tronante -mesmo assim se moderando muito-, que imediatamente a infeliz Semele ficou completamente deslumbrada, perturbada, enlouquecida, desbordada, electrocutada e carbonizada, para grande júbilo da rencorosa Hera, que tinha bem previsto esse trágico desenlace.

No entanto, a maestría e prontidão de Hermes -que foi imediatamente ante os gritos de dor e remordimiento de Zeus- conseguiu sacar a Dionisio do incendiado ventre de sua mãe. Como ainda não estava acabado de gestar, o teve que coser ao mesmo muslo do rei dos deuses, quem o incubó ali até que esteve em condições de nascer.
Ainda que Dionisio foi muito bem escondido depois de seu nascimento e seu guarda de Coribantes dançava ao redor dele, saltando e entrechocando seus escudos, como dantes tinham feito os Curetes cretenses com Zeus menino, para que ninguém pudesse localizar pelo som de seus lloriqueos infantis, a guarda se relajó à medida que passavam nos anos e nada mau ocurriió Mas Hera, tenaz em seu rancor, acabou descobrindo seu esconderijo e, depois de convocar aos rudos titanes sobreviventes, senhores dos elementos materiais, que tinham sido perdoados depois da vitória dos olímpicos, lhes ordenou que acabassem com ele.
Os titanes ganharam-se a confiança do menino oferecendo-lhe brinquedos de ilusão e, quando o tiveram bem enredado e cercado, se lhe arrojaram em cima. Dionisio tentou libertar-se deles tomando a forma de diferentes animais mas, quando assumiu a de touro, aqueles brutotes conseguiram o dominar, o despedaçaram a dentelladas, ferveram sua carne e devoraram a maior parte dela.
Em seguida chegou Zeus, compreendeu o que tinha ocorrido e, lançando raios a torto e a direito, fulminó aos titanes e os reduziu a cinzas. Da carne de Dionisio que os titanes cozinharam, só ficava na olla seu coração. Atenea tomou-o, construiu a partir das mais limpas cinzas dos titanes um corpo de yeso (titanos ou titanio, em grego), pôs nele o coração e prendeu no o lume da vida com um sopro, igual que tinha feito Isis com os restos de Osiris no Egito.

Revestidos daquele corpo, começamos a nascer os seres humanos de nossa raça atual e, desde então, participamos da natureza burda, limitada, agressiva e materialista dos titanes, levando em nossos ossos sua contínua reação e rebeldia à mudança evolutivo, ao mesmo tempo em que também somos animados à evolução pelo fogo imortal do coração do deus que estes acabavam de devorar. Daí nossa dualidad, que nos empurra a um eterno balanço, agora para a terra, agora para o céu.

Declarou então Atenea que, em adiante, a cada um de nós teríamos que limpar as cinzas que recubren nosso corpo de luz através da calcinación de nosso corpo de matéria no fogo purificador do espírito, para poder ascender, convertidos em Dionisio, às esferas da imortalidade ...Já que só através da paixão neste mundo aparentemente limitado se regressa com brilho ao amplo mundo do Ilimitado de onde saiu em um dia o ovo do amor que ao universo criou.


Aquela purificación do que tinha de mortal em seu feto, por médio do fogo divino que destruiu a sua mãe, mais a re-gestación milagrosa no interior mesmo de um imortal, mais este segundo nascimento na dimensão divina, converteu imediatamente a Dionisio no mais jovem dos deuses do Olimpo com o novo nome de Iaco Zagreo, lhe livrando, também, sua mesma divinidad, da perigosa raiva de Hera para sempre.


-Evoé, Dionisio –arrematava sua canção o bardo-, que depois de ter passado pela terrível experiência da morte e do renacimiento em um nível superior, te converteste no deus da espontaneidad, do riso, da liberdade, das plantas que embriagan a alma e que ajudam a esquecer as penas, dos prazeres, do intenso desfrute da felicidade aqui e agora! Evoé, espírito da regeneración capaz de fazer revivir à natureza toda, após que a queimaram a sequedad do agosto e as neves do inverno! Que viva sempre em nosso interior o fogo divino de tua alegria e que ele nos liberte do que fica em nós de pesadez titánica! Evoé! Graças à Vida!


O sol acabou de desaparecer atrás das montanhas, Orfeo deixou de cantar e despediu-o com uma escala de graves que se foi fazendo a cada vez mais tênue e distanciada, até ficar vibrando em um amoroso final expansivo. Seguiu um silêncio no que todos permaneceram uns instantes paladeando a postrera beleza do dia e do canto vos vão. Parecia que o bardo deixava a lira a um lado para se levantar. Mas então tomou sua flauta, fez soar debilmente o conforme básico da melodia de Aglaonice, depois começou a repetir de uma maneira a cada vez mais intensa e mais vibrante, e imediatamente fez regressar ao lugar, voando sobre redemoinhos de notas, a presença contagiante do espírito de Dionisio e de seus desenfrenados coros de sátiros e ninfas em trance risueño, jocoso e profundo.
As devotas de Baco, enfebrecidas de entusiasmo, gritaram ao unísono a invocação à alegria e seguiu a zarabanda e a festa coletiva a pleno são, de uma maneira mais vertiginosa e, ao mesmo tempo, mais harmónica que ao princípio, pois o bardo estava conseguindo que aquela primitiva resonancia ventral que voltava incontinentes as caderas se elevasse pouco a pouco até o coração, incendiando o sentimento, para depois possuir também a coluna, braços e cabeça e expandirse desde ela e se ligar a tudo, tal como se a dança das ménades se tivesse unido à do planeta e até à das estrelas, que pareciam rondar, junto com elas, mais rápido e mais brilhantes que nunca no céu noturno.

Fazer girar e girar em êxtase durante um bom momento e depois deixou-as ascender e elevar-se em amplos círculos aéreos de uma maneira a cada vez mais e mais subtil... onde feminino e masculino e seus conflitos não existiam mais, porque se fundiam na perfeita harmonia de contrastes, na pureza e plenitude andrógina do Ser Original... até que chegou um embriagado silêncio carregado de ritmo, poder e comunión, que foi preludio de um final sorpresivo e radiante, com o que as devolveu à parte mais cordial da Terra.

Todo mundo aplaudiu a rabiar, saltando e gritando e pedindo mais, mas ele lhe passou a flauta a um de seus jovens amigos e se levantou, se inclinando e desculpando com um sorriso. O garoto tratou de manter aquele ambiente o melhor que pôde mas, pouco a pouco, a maioria deixou de se agitar tanto, inclusive quando uma das bacantes o acompanhou e depois o substituiu, assumindo a direção das danças. Seguiu a festa de um modo mais tranqüilo, disperso, familiar e profano, repartindo-se entre todos as viandas e os vinhos que traziam, se acendendo fogueiras, se formando grupos que conversavam animadamente. Alguns casais improvisados foram marchando das mãos para as sombras.

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